Hackers, mensagens e ameaças de atentados. Rússia tentou interferir nas eleições espanholas

O objetivo costuma ser semear o caos, com a ajuda de atores locais, de forma voluntária ou não, para que o resultado eleitoral seja o mais dividido possível: polarizar as opiniões e os eleitores.

Pedro Gonçalves
Julho 26, 2023
15:42

Em 2016 recolheram-se, pelos EUA, as primeiras provas de que a Rússia tentava interferir e sabotar eleições noutros países e, desde então, tornou-se ‘quase habitual’ ouvirmos falar de grupos de piratas informáticos e hackers que levam a cabo ataques contra infraestrutura essencial, mas também que causam ações disruptivas dos processo eleitorais.

O objetivo costuma ser semear o caos, com a ajuda de atores locais, de forma voluntária ou não, para que o resultado eleitoral seja o mais dividido possível: polarizar as opiniões e os eleitores. Os efeitos veri-se-iam no seu máximo no assalto ao Capitólio, após a eleição ‘apertada’ de Joe Biden, e a saída de Trump da Casa Branca.

E nas eleições do passado fim de semana, em Espanha? Os resultados certamente são divididos… Mas, segundo o El Confidencial, o que não veio a público foi a ocorrência de tentativas de ataques informáticos a entidades e infraestruturas críticas, sites falsos, disseminação de ‘fake news’, hashtags a pedir a abstenção e até mensagens de alerta sobre um alegado ataque iminente da ETA.

“São tantos indicadores… Tem de haver alguma coisa por trás disso. O sucesso tem sido absolutamente nulo, mas a vontade está demonstrada. Isso é mais ou menos claro”, indica Carlos Galán Cordero, especialista em tecnologia, inteligência e desinformação que acompanhou o processo.

Os primeiros sinais ocorreram na quinta-feira, com o alerta de que nos canais de Telegram Anonymous Russia e do grupo Killnet corriam mensagens de partilha de bancos de dados relativamente a cidadãos espanhóis e de outros países europeus.

A mensagem não referia especificamente que o alvo seriam as eleições em Espanha e, nesse sentido, não representava uma nova ameaça, já que as tentativas de ataque a infraestruturas essenciais têm vindo a aumentar desde o início da guerra na Ucrânia, ou até antes disso, segundo revelaram fontes do Estado espanhol.

Poderia também tratar-se, admite, de uma atualização, já que a base de dados disponibilizada por quele grupo estava desatualizada há algum tempo.

Já em junho vários grupos de hackers russos tinham anunciado uma ‘aliança’ para atacar o sistema bancário ocidental, causando um alerta na UE, mas que foi desvalorizado na altura.

Por sua parte o grupo russo de piratas informáticos NoName057 fazia referência direta a Espanha: “O primeiro-ministro espanhol Pedro Sánchez prometeu apoiar a Ucrânia pelo tempo que for necessário. Ele anunciou a alocação de um pacote de ajuda a Kiev no valor de €55 milhões. Apoiar Bandera é muito caro e Pedro já está a pagar um alto preço por participar da guerra contra a Rússia. Isso é pago não apenas com o dinheiro dos contribuintes espanhóis, bem como com o equipamento militar, mas também com os próprios espanhóis, ou melhor, com seus padrões de vida”, lia-se na mensagem partilhada.

Era ameaçado com um ataque DDoS (negação de serviço) contra várias entidades, que se cumpriu contra a Casa da Moeda e Selos de Espanha, Ministério da Justiça, Tribunal Constitucional ou da Política Territorial.

Na quinta-feira foi a vez da banca ser afetada e entidades como o Banco de España, CaixaBank, Bankinter, Abanca, Banco Cooperativo, Caja Rural de Granada, Grupo Caja Rural e Ruralvía a ficarem com as aplicações indisponíveis.

O ataque foi depois repelido com sucesso pelas equipas informáticas das empresas afetadas.

Nas 48 horas seguintes seguiu-se nova lista de alvos: metros de várias cidades espanholas, empresas de comboios, autocarros, algumas câmaras municipais, o INE, a Junta Eleitoral e o Ministério do Interior, com a página do último a estar indisponível durante 4 horas.

“Poderíamos participar adequadamente nessas eleições se soubéssemos que o resultado poderia de alguma forma afetar a decisão sobre o apoio ao regime de Zelensky pelas autoridades russofóbicas na Espanha com o dinheiro dos seus contribuintes”, acusava o grupo pouco depois.

No dia da reflexão, a Associação dos Russos Livres denunciou que cidadãos russos a viver em Espanha estavam a receber SMSs em que eram avisados para ameaças de ataques que seriam levados a cabo pela ETA em solo espanhol. O aviso encaminhava para um site falso, com um servidor na Rússia.

Paralelamente, popularizou-se, também através de ‘bots’, a hashtag ‘#quevotezelensky’, no recém nomeado X, em que se apelava à abstenção nas eleições em Espanha, alegando-se que não valia a pena votar, já que seria a palavra e vontade do Presidente ucraniano a que prevaleceria.

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